Ivan Lins - Daquilo que eu sei
sábado, 6 de dezembro de 2008
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
Texto Minhas Férias
Minhas férias,
Pula uma linha, parágrafo!
Christiane Gribel
O primeiro dia de aula é o dia que eu mais gosto em segundo lugar. O que eu mais gosto em primeiro lugar é o último, porque no dia seguinte chegam as férias.
Os dois dias são os melhores dias da escola porque a gente nem tem aula. No primeiro dia não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça está nas férias. E no último dia também não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça já está nas férias.
Era o primeiro dia e era para ser aula de português, mas não era porque todo mundo estava contando das férias. E como todo mundo queria contar mais do que ouvir, o barulho na classe estava mesmo ensurdecedor. O que explica o fato de ninguém ter escutado a professora gritando para a gente parar de gritar. Todo mundo estava bem surdo mesmo. Mas quando ela bateu com os livros em cima da mesa a nossa surdez passou e todo mundo olhou para ela.
Ela estava em pé, na frente do quadro e ficou em silêncio, com uma cara bem brava, olhando para a gente.
Quando um professor está em silêncio com uma cara bem brava olhando para você, é melhor também ficar em silêncio com uma cara de sem graça olhando para um ponto qualquer que não seja a cara brava do professor.
A professora puxou a cadeira dela e se sentou.
Atrás dela, no quadro negro, eu vi decretado o fim das nossas férias e o fim do nosso primeiro dia de aula sem aula. Estava escrito:
Redação: escrever 30 linhas sobre as férias.
Eu sabia que as férias de ninguém iam ser mais as mesmas na hora que virassem redação. É simples: férias é legal, redação é chato. Quando a gente transforma as nossas férias numa redação, elas não são mais as nossas férias, são a nossa redação. Perdem toda a graça.
Todo mundo tirou o caderno de dentro da mochila. Menos eu.
Eu fiquei olhando para aquela frase no quadro enquanto os zíperes e velcros das mochilas eram os únicos barulhos na sala. De repente as nossas férias ficaram silenciosas. Onde já se viu férias sem barulho?
E, além do mais, eu tenho certeza de que a professora nem quer saber de verdade como foram as nossas férias. Ela quer só saber como é nossa letra e se a gente tem jeito para escrever redação. Aqueles dois meses inteirinhos de despreocupações estavam prestes a virar 30 linhas de preocupações com acentos, vírgulas, parágrafos e ainda por cima com letra legível depois de tanto tempo sem treino.
A turma inteira já estava escrevendo quando eu percebi que a professora estava só olhando para mim.
Quando um professor fica parado só olhando para você é porque você tinha que estar fazendo outra coisa que não era o que você estava fazendo.
A outra coisa que eu tinha que estar fazendo era a minha redação. Então eu puxei a minha mochila e peguei o caderno. É claro que minha mochila tem o fecho de velcro e que todo mundo olhou para mim quando eu abri. Só a professora é que não olhou de novo porque ela já estava olhando antes mesmo. Peguei a caneta. Eu nem sabia mais segurar direito a caneta. Escrevi:
Minhas férias
Mas a letra ficou péssima e eu resolvi arrancar a folha para começar bem o meu caderno. E todo mundo olhou de novo para mim, até a professora que já tinha parado de me olhar.
Troquei a caneta por um lápis, assim se a letra ficasse horrível era só apagar em vez de ter que arrancar outra folha.
Coloquei as minhas férias bem lá no alto e bem no meio da página. Pulei uma linha.
Parágrafo...
- x – x – x – x – x -
Christiane Gribel nasceu no Rio de Janeiro em maio de 1968. Com 11 anos mudou-se para São Paulo onde mora até hoje.Formou-se em publicidade, trabalhou como redatora publicitária e decidiu dedicar-se à literatura infantil. Com seu primeiro livro chamado Histórias de um pequeno astronauta, ganhou o Prêmio Jabuti, como autora revelação. Minhas férias, pula uma linha parágrafo, foi retirado do livro de mesmo nome, editora Salamandra.
In Ciência hoje das crianças, ano 15, n.º 131, dezembro de 2002. Pp. 6-7.
Pula uma linha, parágrafo!
Christiane Gribel
O primeiro dia de aula é o dia que eu mais gosto em segundo lugar. O que eu mais gosto em primeiro lugar é o último, porque no dia seguinte chegam as férias.
Os dois dias são os melhores dias da escola porque a gente nem tem aula. No primeiro dia não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça está nas férias. E no último dia também não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça já está nas férias.
Era o primeiro dia e era para ser aula de português, mas não era porque todo mundo estava contando das férias. E como todo mundo queria contar mais do que ouvir, o barulho na classe estava mesmo ensurdecedor. O que explica o fato de ninguém ter escutado a professora gritando para a gente parar de gritar. Todo mundo estava bem surdo mesmo. Mas quando ela bateu com os livros em cima da mesa a nossa surdez passou e todo mundo olhou para ela.
Ela estava em pé, na frente do quadro e ficou em silêncio, com uma cara bem brava, olhando para a gente.
Quando um professor está em silêncio com uma cara bem brava olhando para você, é melhor também ficar em silêncio com uma cara de sem graça olhando para um ponto qualquer que não seja a cara brava do professor.
A professora puxou a cadeira dela e se sentou.
Atrás dela, no quadro negro, eu vi decretado o fim das nossas férias e o fim do nosso primeiro dia de aula sem aula. Estava escrito:
Redação: escrever 30 linhas sobre as férias.
Eu sabia que as férias de ninguém iam ser mais as mesmas na hora que virassem redação. É simples: férias é legal, redação é chato. Quando a gente transforma as nossas férias numa redação, elas não são mais as nossas férias, são a nossa redação. Perdem toda a graça.
Todo mundo tirou o caderno de dentro da mochila. Menos eu.
Eu fiquei olhando para aquela frase no quadro enquanto os zíperes e velcros das mochilas eram os únicos barulhos na sala. De repente as nossas férias ficaram silenciosas. Onde já se viu férias sem barulho?
E, além do mais, eu tenho certeza de que a professora nem quer saber de verdade como foram as nossas férias. Ela quer só saber como é nossa letra e se a gente tem jeito para escrever redação. Aqueles dois meses inteirinhos de despreocupações estavam prestes a virar 30 linhas de preocupações com acentos, vírgulas, parágrafos e ainda por cima com letra legível depois de tanto tempo sem treino.
A turma inteira já estava escrevendo quando eu percebi que a professora estava só olhando para mim.
Quando um professor fica parado só olhando para você é porque você tinha que estar fazendo outra coisa que não era o que você estava fazendo.
A outra coisa que eu tinha que estar fazendo era a minha redação. Então eu puxei a minha mochila e peguei o caderno. É claro que minha mochila tem o fecho de velcro e que todo mundo olhou para mim quando eu abri. Só a professora é que não olhou de novo porque ela já estava olhando antes mesmo. Peguei a caneta. Eu nem sabia mais segurar direito a caneta. Escrevi:
Minhas férias
Mas a letra ficou péssima e eu resolvi arrancar a folha para começar bem o meu caderno. E todo mundo olhou de novo para mim, até a professora que já tinha parado de me olhar.
Troquei a caneta por um lápis, assim se a letra ficasse horrível era só apagar em vez de ter que arrancar outra folha.
Coloquei as minhas férias bem lá no alto e bem no meio da página. Pulei uma linha.
Parágrafo...
- x – x – x – x – x -
Christiane Gribel nasceu no Rio de Janeiro em maio de 1968. Com 11 anos mudou-se para São Paulo onde mora até hoje.Formou-se em publicidade, trabalhou como redatora publicitária e decidiu dedicar-se à literatura infantil. Com seu primeiro livro chamado Histórias de um pequeno astronauta, ganhou o Prêmio Jabuti, como autora revelação. Minhas férias, pula uma linha parágrafo, foi retirado do livro de mesmo nome, editora Salamandra.
In Ciência hoje das crianças, ano 15, n.º 131, dezembro de 2002. Pp. 6-7.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Gestora Emei Maria Madalena.
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